segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

UMA MARAVILHOSA FÁBULA


Quando meus filhos eram bem pequenos eu conheci esta fábula. Estava na seção de livros de um hipermercado, quando vi o livro e, ali mesmo, o li. Claro que, como boa chorona que sou, me emocionei muito. As emoções causadas pelo livro nunca mais saíram de mim.

ADIVINHA QUANTO EU TE AMO
Sam McBratney

Era hora de ir para a cama, e o Coelhinho se agarrou firme nas longas orelhas do Coelho Pai. Ele queria ter certeza de que o Coelho Pai estava ouvindo e disse:- Adivinha quanto eu te amo? - Ah, acho que isso eu não consigo adivinhar - respondeu o Coelho Pai.- Tudo isso!Disse o Coelhinho, esticando seus bracinhos o máximo que podia.Só que o Coelho Pai tinha os braços mais compridos. E disse:- E eu te amo tudo isto !Huuum, isso é um bocado, pensou o Coelhinho e disse:- Eu te amo toda a minha altura.- E eu te amo toda minha altura - disse o Coelho Pai.Puxa, isso é bem alto, pensou o Coelhinho. Eu queria ter os braços compridos assim. Então o Coelhinho teve uma boa idéia. Ele se virou de ponta cabeça, apoiando as patinhas na árvore.- Eu te amo até as pontas dos dedos de meus pés!- E eu te amo até as pontas dos dedos dos teus pés - disse o Coelho Pai balançando o filho no ar.- Eu te amo a altura de meu pulo! - riu o Coelhinho saltando, para lá e para cá.- E eu te amo a altura do meu pulo - riu também o Coelho Pai e saltou tão alto que suas orelhas tocaram os galhos das árvores.- Eu te amo toda a estradinha daqui até o rio - gritou o Coelhinho.- Eu te amo até depois do rio até as colinas - disse o Coelho Pai.É uma bela distância, pensou o Coelhinho. Ele estava sonolento demais para continuar pensando. Então ele olhou para além das copas das árvores, para a imensa escuridão da noite. Nada podia ser maior do que o Céu.- Eu te amo ATÉ A LUA! - disse ele, fechou os olhos e dormiu.- Puxa, isso é longe disse o Coelho Pai. Longe mesmo!O Coelho Pai deitou o Coelhinho na sua caminha de folhas. E então se inclinou para lhe dar um beijo de Boa Noite. Depois, deitou-se ao lado do filho e sussurrou sorrindo:- Eu te amo até a lua...IDA E VOLTA !

sábado, 7 de fevereiro de 2009

RAUL



Raul era um bom menino. Cresceu ajudando todos a sua volta. Foi coroinha, começou a trabalhar cedo, pagou a escola dos irmãos. Casou-se com a primeira namorada. Por amor. Trabalhou, teve filhos, prosperou. Sempre ajudando todos a sua volta. Pensava em todos. No faxineiro e na família do faxineiro. Na secretária e na família da secretária. Nos funcionários e na família dos funcionários. E o tempo passou. Raul adorava ajudar. Pagou colégios, faculdades, telhados e cirurgias. Mas esqueceu um detalhe em sua vida. Um detalhe pequeno, porém crucial para seu futuro. Raul se esqueceu de ajudar a si mesmo. De proteger a si mesmo. E o tempo passou. Raul envelheceu. Tranquilo. Achava que estava resguardado por Deus. Mas Deus nos diz: faça sua parte que eu farei a minha. E Raul não fez a sua parte. Esqueceu-se de si. Aí veio o turbilhão. A avalanche o atingiu. Tirou-lhe o trabalho, seu ganha pão. Tirou-lhe o mérito, o orgulho, e com eles, tirou-lhe a dignidade. Ficou perplexo. Não podia acreditar. E negou. Negou pela manhã, negou pela tarde, negou pela noite. Negou três vezes. Logo ele, que sempre pensou em todos, em detrimento de si mesmo? Este era o problema, mas Raul não conseguia perceber. E continuou negando. E em sua negação, não fazia nada para defender-se. Fugiu dos pensamentos mais sombrios, viveu fingindo para si mesmo que não era tão grave assim. E seguiu, bloqueando a mente parar não enfrentar, para não sofrer. Assim, sua mente começou a falhar. Já não era tão ágil como antes e começou a criar um mundo paralelo, onde o sofrimento, as traições, a ingratidão não podiam entrar. E Raul vivia assim. alheio ao que poderia ter sido, ao que poderia ter realizado. Raul já não era aquele menininho que corria pela rua, subia em árvores, ajudava a mãe. Já não era aquele jovem que sonhava com um futuro brilhante ao lado da linda namorada. Já não era aquele homem maduro, bem sucedido e respeitado que ajudava a todos. Raul envelheceu. E o mundo, aquele que foi ajudado por ele, para o qual ele devotou sua vida, Aquele mundo, o esqueceu. Mas Raul, alheio ao mundo real, continuava vivendo, ao lado da primeira namorada, cercado por gatos, cercado por filhos, cercado por netos. Velhinho por fora, menino por dentro.....



Nossos Velhos

Pais heróis e mães rainhas do lar.Passamos boa parte da nossa existência cultivando estes estereótipos.Até que um dia o pai herói começa a passar o tempo todo sentado, resmunga baixinho e puxa uns assuntos sem pé nem cabeça.A rainha do lar começa a ter dificuldade de concluir as frases e dá prá implicar com a empregada.O que papai e mamãe fizeram para caducar de uma hora para outra?Fizeram 80 anos.Nossos pais envelhecem.Ninguém havia nos preparado para isso.Um belo dia eles perdem o garbo, ficam mais vulneráveis e adquirem umas manias bobas. Estão cansados de cuidar dos outros e de servir de exemplo: agora chegou a vez de eles serem cuidados e mimados por nós, nem que para isso recorram a uma chantagenzinha emocional.Têm muita quilometragem rodada e sabem tudo, e o que não sabem eles inventam.Não fazem mais planos a longo prazo, agora dedicam-se a pequenas aventuras, como comer escondido tudo o que o médico proibiu. Estão com manchas na pele. Ficam tristes de repente. Mas não estão caducos: caducos ficam os filhos, que relutam em aceitar o ciclo da vida.É complicado aceitar que nossos heróis e rainhas já não estão no controle da situação. Estão frágeis e um pouco esquecidos, têm este direito, mas seguimos exigindo deles a energia de uma usina.Não admitimos suas fraquezas, seu desânimo.Ficamos irritados se eles se atrapalham com o celular e ainda temos a cara-de-pau de corrigi-los quando usam expressões em desuso: calça de brim? frege? auto de praça?Em vez de aceitarmos com serenidade o fato de que as pessoas adotam um ritmo mais lento com o passar dos anos, simplesmente ficamos irritados por eles terem traído nossa confiança, a confiança de que seriam indestrutíveis como os super-heróis.Provocamos discussões inúteis e os enervamos com nossa insistência para que tudo siga como sempre foi.Essa nossa intolerância só pode ser medo.Medo de perdê-los, e medo de perdermos a nós mesmos, medo de também deixarmos de ser lúcidos e joviais. É uma enrascada essa tal de passagem do tempo.Nos ensinam a tirar proveito de cada etapa da vida, mas é difícil aceitar as etapas dos outros, ainda mais quando os outros são papai e mamãe, nossos alicerces, aqueles para quem sempre podíamos voltar, e que agora estão dando sinais de que um dia irão partir sem nós.
Autora Marta Medeiros